domingo, 18 de setembro de 2011

A nova classe é média? Onde?

No Brasil o “mercado livre”, especialmente os seus propagandistas através da comunicação social midia, celebra o surgimento de uma nova “classe média C”. A Globo classifica o fato como um aumento do poder aquisitivo da população trabalhadora e exagera prevendo que comprarão casas e carros, frequentarão lojas de roupas finas e restaurantes e todas as “maravilhas” que sempre foram reservadas para a burguesia rica

Um sonho, se não fosse aplicado ao Brasil, seria o estafado sonho americano que hoje acorda no buraco com 46 milhões de pobres no país rico Estados Unidos da América. Sonhar faz bem à saúde porque relaxa e, dizem, não paga imposto. Não tenho certeza disso. Mas a alienação da realidade histórica que nos circunda pode levar ao buraco imprevisto e os meios de comunicação devem servir para alertar sobre os riscos e perigos mais que para enganar os cidadãos.

Os vocábulos têm um significado original que deve ser respeitado para não desvirtuar o idioma já tão combalido. "Classe média" é a que fica no meio, entre os ricos e os pobres, portanto a que tem o poder aquisitivo mediano. Entre os salários existentes no Estado (menores do que o dos executivos do mundo financeiro e das empresas a ele ligadas fraternalmente) vão dos R$ 500 aos que chegam a mais de 50 vezes aquele mínimo. "Classe média", no âmbito do Estado, deveria ter uns 25 vezes 500. Nada disso, já é promovido ao C da "classe média", o que chega a uns 4 salários mínimos. Então o sonho de aumentar o conforto e o consumo, é mentira deslavada (que a Globo deve rever através do simpático Lessa).

Mas os cálculos estatísticos que refletem o poder aquisitivo de um povo são mais complicados ainda. Não basta ver se podem comprar a cesta básica, tratar a saúde pelo SUS, levar os filhos à escola pública e se divertir vendo novelas, jogo de futebol no campinho, dançando um forró, bebendo refrigerante ou cerveja, e por aí vai a vida alegre de muitos brasileiros. Os ricos, dentro dos limites salariais do Estado, têm convênios médicos (dos bons, com médicos e hospitais à disposição), transportam-se com carros à porta, os filhos vão às melhores escolas, o seu divertimento passa por teatros, espetáculos de balé, viagens ao exterior, esporte de alto custo, descansos na praia ou no campo, boa comida (cada uma dando para pagar uma cesta básica), bebidas finas, drogas, e tratamentos de recuperação, e sei lá mais o quê, além da impunidade para os excessos. Sei menos ainda onde se situa a media do poder aquisitivo deles.

Mais complicado ainda será calcular dentro da riqueza nacional, como se dá a distribuição – tanto em salários como em benefícios oferecidos pelas instituições (teoricamente de todo o povo, incluindo a elite) – para todos os cidadãos brasileiros.

Antigamente, havia uma classe rica (detentora do poder de usar os recursos tanto privados como públicos), uma classe média que somava remediados (com heranças familiares que garantiam pelo menos a habitação e a escola) com os que labutavam duramente pela ascensão social através da formação profissional, e os pobres que seriam mais pobres se desempregados ou afundados na marginalidade social. Agora, com as especializações do famoso mercado livre surgiram divisões, principalmente para a "classe média" que vai de A (rica, vista de baixo para cima) a E (vista de cima para baixo, com um pé fora da miséria). Os produtos de consumo procuram ter preços para cada nível, assim uma blusa simples custa R$ 300 para o A, R$ 30 para o C e uns R$ 7 na feira ou no brechó para o E. Todos vestem dando visibilidade á sua sorte social. Claro que nem todos podem frequentar os mesmos lugares com tais trapos que vão do luxo ao lixo.

Talvez os mais entendidos na adaptação do mercado livre (quer dizer, livre dentro dos respectivos limites de posse) sejam os chineses que conseguem abarrotar as “classes médias” de A a C nas suas lojas na Europa e Estados Unidos, e do novo C ao E em qualquer país em desenvolvimento. São os orientais que cuidam das “classes médias” e lucram com os seus consumos aparentemente parecidos, mas de qualidade, também aparentemente, muito diferente. As diferenças de poder aquisitivo são determinadas pelos países com as suas piores ou melhores distribuições de renda institucionalizada. Por isso é que o pobre na França vive com apenas R$ 900, o pobre norte-americano com mais ou menos o mesmo, mas sem o serviço de saúde e outros benefícios básicos que a Europa já tinha no século 20 e em parte conserva apesar dos cortes iniciados pelos neo-liberais nas últimas décadas, e o pobre brasileiro que precisa ser salvo da fome e da marginalidade com o sistema de bolsa família que, felizmente, funciona.

Mundo globalizado ou "classe média" que consome como rico é conversa para quem segue a midia sem pensar, quem engole as belas frases de propaganda do mercado livre sem mastigar. Ascensão social que mereça respeito é a que se dá pelo aprimoramento cultural e a formação profissional com duríssimo trabalho, isto sempre foi e será assim. Outro caminho, tipo milagre rapidinho, é caminho perigoso e o fim da ilusão é dolorosa.

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